Os otimistas se cansam menos

Rodrigo Ortiz Vinholo
9 min readJun 23, 2020

Por mais que os otimistas tenham adquirido uma péssima fama, especialmente neste mundo e nesta época em que não faltam bons motivos para reclamar das coisas, eu preciso escrever algumas palavras em defesa deles, reforçando meu desejo cada vez maior de me tornar uma pessoa digna de ser parte desse grupo.

Não, este não é aquele tipo de texto que vai te dizer para você sorrir e o mundo vai sorrir de volta, ou para você “vibrar coisas boas” para o universo te recompensar. Também não falarei sobre mentalizações, nem sobre terapia. Ainda que eu tenha opiniões muito específicas sobre cada um desses temas, eu sei que vocês não estão aqui para isso, ou ao menos não deveriam estar.

Eu quero falar de maneira prática, direta, e com o menor tanto de firulas que eu puder sobre como o otimismo é um bom negócio para a sua disposição física, mental e emocional, de modo totalmente subjetivo, a partir da minha própria experiência de vida, e sem qualquer embasamento científico. Parece bom? Se não parece, continue lendo mesmo assim.

Eis minha tese: Os otimistas se cansam menos. Os pessimistas, pela lógica que quero apresentar, são pessoas cansadas — ou, ao menos, mais cansadas. Eu posso falar com propriedade sobre isso, acredite.

Antes de darmos qualquer passo a mais, porém, devo fazer mais um aviso, ressaltando que este não é um texto sobre depressão. Este é um texto sobre comportamento e auto-estudo, mas não é recomendado como meio de tratamento para qualquer pessoa com questões clínicas pendentes. Eu não tenho formação para falar sobre depressão e similares, e você não deveria ler qualquer texto sobre o assunto de quem não tem formação para falar sobre isso. Não passe este texto para quem tem depressão esperando que isso ajude a pessoa a se curar, e não espere que este texto seja uma cura para a sua depressão. Se você precisar de ajuda e medicação, procure um profissional.

Agora que tiramos isso do caminho, vamos falar de comportamento. Mais especificamente, sobre como é cansativo demais ser pessimista. Só que antes vamos falar sobre sofrimento e preocupação como um todo.

Eu sou uma pessoa com uma mente muito ativa. Estou sempre trabalhando, criando e, se me distrair, transformo até mesmo minha diversão em algo quantificável e classificável, em algum tipo de trabalho. Com consciência disso, e de outras tantas coisas mais, eu desenvolvi uma capacidade de observar muito meus sentimentos, minha mente e meu corpo. Claro que ainda falta muito para eu aprender, mas me sinto capaz de opinar e dar alguns conselhos.

Toda vez que eu estou preocupado, eu produzo menos. Aquela história do escritor sofredor ganhar inspiração? É balela. Talvez exista alguém em algum lugar do mundo, mas da minha experiência e da de várias pessoas que conheço, os momentos de maior produção não estão ligados com sofrimento. Podem ser posteriores? Podem. Mas durante? É bem mais difícil.

Eu diria que existem dois motivos principais para que isso ocorra.

O primeiro é simples: preocupação gasta energia. Nós somos como computadores, e temos nossa memória de processamento. Se você abre abas demais no seu navegador, seu computador vai certamente ficar lento, ou vai travar e, pode até sobreaquecer. Na vida real, preocupação e sofrimento te deixam em um estado de defesa. Seu corpo, mente, sentimentos, querem bater ou correr. Como você fica o tempo todo pronto para evitar o que te faz sofrer, você já está usando mais energia do que usa para fazer qualquer outra coisa na vida.

O segundo motivo é que preocupação te faz perder tempo. Isso se dá em vários sentidos: primeiro, você dispersa sua atenção com mais facilidade. Segundo, se você está trabalhando com menos energia por conta da tensão que mencionei no motivo um, você tem um resultado pior. E terceiro, por consequência, se você está se distraindo mais e está com pior resultado na tarefa em questão, você terá que trabalhar mais ou por mais tempo para ter a qualidade que esperava — e talvez até tenha que se estressar por conta de problemas gerados pela falta de qualidade. Ou seja, em longo prazo vai gastar mais energia para fazer a mesma coisa que faria — ou menos — se não tivesse a preocupação, para começar.

Isso não é nenhum segredo para ninguém, né? Entendo que não teremos muita discordância aqui, se é que teremos alguma. Bom, seja lá qual for sua opinião, eu seguirei com a minha ideia e chegou a hora de ligarmos isso ao pessimismo.

Ser pessimista cansa, porque sofrer cansa.

Faz sentido?

(Note que estou falando do conceito geral do termo, e nem estou entrando em Schopenhauer aqui que nem tenho cacife acadêmico pra isso.)

Pense bem: o pessimista, em geral, espera que o pior vá acontecer. Só que tudo que nós identificamos como ruim necessariamente nos faz antecipar algum sofrimento. Isso se reflete em várias situações, mas vamos focar em dois momentos.

Se você está um momento neutro — nada em particular acontece, você está em um ponto anterior a alguma ação ou decisão — e você antecipa sofrimento, duas coisas, no geral, podem acontecer: ou você vai realmente ter os efeitos de sofrimento, como os discutidos acima… ou você vai esperar que o pior ocorra e isso vai manipular seu comportamento de modo a não permitir que você tenha a atenção, confiança ou mesmo agilidade para fazer o que quer, ou não de modo plenamente efetivo. O pessimista tem mais facilidade de se sabotar antes de começar, porque foca na pior possibilidade e já se cansa antes de tudo.

A meu ver, isso é pior ainda no momento em que você está fazendo algo de uma maneira mais ativa. Se você tomar uma decisão ou realizar uma ação e o resultado for negativo, quando sua reação padrão é sofrer, você tem que lidar o que já gastou de energia atuando, errando e talvez sofrendo por isso, e ainda vai sofrer mais porque vai ficar pensando que as coisas podem piorar, ou que não estão bem.

Sinto que muitas pessoas podem discordar dessas palavras, especialmente pela fama de cautela, preparo, sobriedade e objetividade que os pessimistas agregaram. Mas preciso discordar disso, tanto porque o pessimista não é necessariamente objetivo, quanto porque, veja, o pessimista não é mais cauteloso.

Claro que ele pensa nos piores cenários, mas isso não torna os cenários reais, e nem há a garantia que pensar nos piores cenários ajude. Qualquer coisa diferente do pior é muito mais fácil de ser ignorada pelo pessimista. Então ele tem a chance de não ter a cautela e de ter a falta de preparo!

Mas o principal, aqui, é que se o pior não acontecer, o investimento de energia do pessimista já ocorreu, e continua ocorrendo até o último instante. Se você tem em uma competição duas pessoas com as mesmas habilidades e níveis de energia, em um cenário em que só pese performance, a que usar menos energia geralmente tenderá a ter melhor resultado.

Se você for ao menos um pouco como eu, talvez esteja se perguntando se o otimista não é, comparativamente, despreparado. E é aí o primeiro pulo do gato: o pessimista entende o que seria o melhor, não acredita na possibilidade, e se foca no pior como improvável. O otimista entende o que seria o pior, mas não se foca nessa possibilidade.

Eu diria que, em muitos casos, os melhores otimistas não são aqueles que esperam que tudo vai dar certo. São só os que não se focam nas coisas darem errado. É esse o tipo de pessoa que eu acredito que todos devem ser.

O otimista em neutralidade não se cansa com o sofrimento antecipado, ou se cansa minimamente porque não se fixa nela. Do mesmo modo, o otimista na ativa não é necessariamente surpreendido por algo que deu errado, mas faz o possível para não se fixar no sofrimento de algo que o afetou.

Este é um daqueles casos em que a linguagem prejudica a nossa percepção do mundo: em tudo que estou falando aqui, estou usando “otimista” meramente como o oposto do “pessimista”, mas isso não significa que “otimismo” se refere a um extremo de expectativa.

O segredo aqui é uma expressão que os estadunidenses gostam muito que fala sobre “esperar pelo melhor e se preparar para o pior.” Entendo que esse seja o ponto de equilíbrio ideal. Você pode se preparar para o pior e não esperar que ele aconteça.

Você vai se preocupar diariamente, obsessivamente sobre seu carro ser roubado? Lógico que não, mas você vai procurar ter um seguro e estacioná-lo em um local seguro. Parece óbvio, né? Então olhe bem para a sua vida e veja com quantas coisas você não está tendo esse mesmo comportamento com qualquer outra coisa, em outra escala, simplesmente porque parece mais natural fazer assim. É ridículo, eu sei, mas muitas vezes é fácil cairmos nesse tipo de expectativa.

Expectativa, aliás, é uma coisa que é invariavelmente ligada a pessimismo e otimismo, mas que corre paralelamente. Uma regra para a vida: quanto maior sua expectativa, maior a chance de frustração.

É fácil pensarmos que o pessimista é uma pessoa com uma expectativa alta para o pior e o otimista com expectativa alta para o melhor, mas eu discordo disso. Os dois, como eu disse acima, se fixam em um polo de tipo de expectativa. O quanto se injeta de expectativa em cada direção é independente. Isso dito, é minha percepção que os pessimistas tendem a injetar mais expectativa do que a maior parte dos otimistas.

Espero que tudo isso tenha feito sentido. Antes de acabar, eu quero deixar tudo isso um pouco mais prático. Afinal, eu falei muito sobre ideias, conceitos e abstrações, mas eu falei pouco sobre como colocar essas coisas em prática na sua vida. Vamos a algumas ideias:

1- Observe seus pensamentos e expectativas: Isso requer treinamento, mesmo. Leve atenção ao seu humor, a tudo que você pensa, e identifique onde você está errando. É como eu dei no exemplo acima com o seguro de carro. Se você tem um problema contínuo que te causa preocupação e não o resolve, ele continuará roubando sua energia até que se resolva, que piore, ou que você deixe de se importar com ele.

Geralmente, o melhor cenário é que você o resolva, claro. Piorar vai aumentar sua perda de energia, e potencialmente te trazer outros problemas. Se você conseguir não se importar com algo, muitas vezes pode ser útil, mas cuidado com o que faz isso: existe uma diferença entre não se importar com o que é incontrolável e negligenciar sua responsabilidade e poder de ação.

2- Foco no momento presente: Sabe o que todo mundo fica falando de “estar presente”? Isso não é só papo de meditação e auto-cuidado. Isso tem relação direta também com o seu uso de energia. Claro que ficar sonhando com um futuro de modo otimista também te distrai, mas ficar sofrendo por antecipação não te ajuda. Foque no que você está fazendo a cada vez. Tenha uma agenda, tenha organização, para que sua cabeça possa se focar no “aqui e agora”.

3- Force positividade: Sério. Isso é meio esquisito, no começo, mesmo. Mas se você for ver a maior parte das pessoas que falam de mudança de hábito, este é um bom jeito de mudar a sua mudança de hábito. Mas por que “forçar”? Porque você provavelmente, como muita gente, tem o hábito de ter a reclamação e o pessimismo como padrões comportamentais. Aí na hora que alguma coisa acontece, você reage com pessimismo diretamente, e já começa a gastar energia antes de se controlar. O trabalho de fingir te ajuda a ao menos observar seu hábito. Você para, pensa, e isso já te resolve. Pode parecer falso, mas o importante é você não ficar jogando energia fora. Acredite: mesmo esse exercício de fingir geralmente te causa menos esforço do que o esforço de esperar o pior.

4- Mantenha a atividade: Longe de mim falar para você enterrar seus sentimentos, mas entenda que muitas vezes é na inatividade que temos mais facilidade de ficarmos preocupados. Atividade ajuda você a focar seus esforços em fazer o que deve ser feito. Lembre-se do que falei acima, se você está gastando energia à toa, não conseguirá fazer o que quer ou o que deve, e gastará mais energia. Se você já atua diretamente, reduz a chance de ter esse desperdício.

É isso. Boa sorte.

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Rodrigo Ortiz Vinholo
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Written by Rodrigo Ortiz Vinholo

Publicitário, jornalista, escritor, professor e pessoa estranha.

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