O Mínimo que se Espera

Rodrigo Ortiz Vinholo
2 min readApr 22, 2019

Não é porque o padrão se tornou ruim, que o menos ruim é bom.

Pronto. Isso é tudo que eu queria dizer com este texto. Se tem algo que você deveria tirar deste texto todo, é isso. Daqui pra baixo, é tudo explicação.

Vamos lá, comecemos com um exemplo: políticos.

Entendemos que políticos devem representar o povo. E que devem ser honestos quando realizarem suas atividades. E que devem ser qualificados a exercer as atividades que precisam exercer. Até aqui, tudo bem, né? Ninguém discorda?

Ao mesmo tempo, entendemos que isso não é o caso, na prática, então tratamos como padrão que os políticos sejam desonestos. Nós ainda sabemos qual é o padrão original, mas quando ele se mostra incompatível com a existência prática, nos vemos obrigados a alterar essa lógica, porque só podemos votar nos políticos que se candidatarem.

Nesse contexto, um candidato ou político que não for comprovadamente desonesto pode ser tratado como bom. Em vez de “ser honesto” ser o padrão, “não ser desonesto” passa a sê-lo. E outras características podem ser ignoradas ou igualmente enfraquecidas, na falta de comparativos positivos.

O problema, aqui, é que frente à necessidade de analisar isso sob uma nova ótica, o “menos ruim” se torna o “bom” mesmo no nosso entendimento geral. Então qualquer crítica que surgir no paradigma antigo será entendida como excessiva por aqueles que aceitaram a nova abordagem.

Quem aceita o novo padrão, especialmente de defender o político do padrão “menos ruim”, deixará de considerá-lo “menos ruim”, e de apontá-lo como tal. No longo prazo, os requisitos mínimos seguem sendo baixados e nos surpreendemos com a desgraça que estabeleceu-se, ignorando que nós que a criamos.

Independentemente de paixões, isso é um exercício de percepção e análise que deve ser feito conscientemente e com esforço para que possamos entender o mundo.

Circunstâncias ajudam, mas é importante se lembrar: uma cama dura é melhor que nenhuma, mas isso não a torna uma boa cama.

Se você está morrendo de fome, até comida podre será “boa”, porque é melhor do que morrer de fome, mas a comida podre jamais será “boa” para quem tem comida fresca em casa.

Alguém que saiba primeiros socorros pode salvar uma vida, mas não é “bom” como médico simplesmente porque ninguém mais sabe medicar.

Uma bula de remédio não é uma leitura “boa” porque não existe outro tipo de material e você quer muito ler alguma coisa.

Claro que nossos requisitos mínimos para qualquer coisa dependem do que conhecemos, e que nossa experiência deve mudar esses padrões sempre, mas devemos trabalhar para que os padrões evoluam apenas em direção a maiores exigências de qualidade, nunca a menores.

Resumindo: não é porque o padrão se tornou ruim, que o menos ruim é bom.

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Rodrigo Ortiz Vinholo
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Written by Rodrigo Ortiz Vinholo

Publicitário, jornalista, escritor, professor e pessoa estranha.

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