Não faça com os outros NEM o que você gostaria que fizessem com você

Rodrigo Ortiz Vinholo
3 min readNov 23, 2023
"Os elefantes" (1948), Salvador Dali

Alguns ditados resumem bem as soluções para incontáveis problemas da humanidade. O problema é que nós não os seguimos… ou seguimos errado.

Por exemplo: “não faça com os outros o que não gostaria que fizessem com você”. Esse é bom, né? Outro é “viva e deixe viver” e outro, ainda, é “muito ajuda quem não atrapalha.”

Mas existem algumas sutilezas nessa história toda que as pessoas nem sempre entendem e, como se não bastasse as pessoas que atrapalham, tem gente que atrapalha porque está ajudando, e acha que está deixando viver quando não está. Isso porque, em resumo, aquilo que você gostaria que fizessem com você nem sempre é o que os outros querem.

Lógico, entre um soco e um abraço, a escolha é óbvia, mas pensando como gradação, o espaço intermediário é imenso, e existem mil outras opções que sequer entram nesse universo.

Responda agora, mentalmente: se você está triste, como prefere que as outras pessoas te ajudem? E se estiver morrendo de cansaço, depois de um dia longo e estressante? E se estiver doente?

A minha resposta para esses exemplos é que as pessoas me deixem em paz. Sério. Não falem comigo, me deixem em silêncio, fazendo o que eu estiver fazendo. Tenho plena consciência de que existem pessoas que são o completo oposto do que eu sou, e é aqui que quero chegar com este texto.

Quando tentamos ajudar os outros, geralmente estamos tendenciados a fazer o que queremos que façam com a gente. É natural, de certo modo, e a nossa sociedade e seus clichês reforçam isso com sucesso. Nós falamos de “empatia”, repetimos frases good vibes, mas ignoramos que a empatia real, mais do que tentar a “nossa” cura, envolve entender e apresentar a cura dos outros, mesmo contra nossa própria natureza, e isso inclui até não fazer nada, seja porque não querem ou porque não somos capazes de fornecer o que querem.

Aí que entra uma coisa difícil: se nós oferecemos algo que para nós é o caminho, isso geralmente vai com uma carga considerável de significado. A rejeição disso é intimamente ofensiva. Se uma pessoa não gosta de algo que você fez para ajudar, é provável que você vá sentir que ela está te atacando, justamente porque a sua solução é algo pessoal.

Só que do lado de quem você tentou ajudar, fica uma questão complicada, porque você está dando mais trabalho para ela. Se aceitar algo que não quer, vai estar ainda mais desconfortável. Se não aceitar, ela tem a chance de magoar você, e ainda talvez tenha que explicar, porque simplesmente não vai fazer sentido para você que ela não queira receber o que você considera certo.

Muita gente acaba vivendo assim, aceitando, aceitando e se desgastando com isso. Ou dando uma resposta que para a outra pessoa é insuficiente, porque as duas não estão falando a mesma língua. Ou, simplesmente, se desgastando a cada rejeição inevitável.

E aí nascem as frustrações do tipo “eu me sacrifico tanto por essa pessoa e ela nem liga”, “ela não entende que eu quero o melhor para ela” ou “ela é mal-agradecida”. Lógico que existem casos de pessoas mal-agradecidas, mas é fato que muitas vezes isso é a resposta à rejeição de quem só não queria ser ajudado porque a sua ajuda não fazia sentido.

Sabe o que é mais bizarro em tudo isso? Nós também temos esses mesmos problemas até em situações boas. Nem todo mundo comemora, descansa, socializa do mesmo jeito. E é óbvio, claro, mas esquecemos disso facilmente.

É muito raro você me ver em um show de música, mas eu conheço pessoas que iriam todo dia se pudessem. Quem está errado? Ninguém. Só está errado quem acha que o outro está errado, ou que não “aprendeu” o “melhor jeito”, o “caminho verdadeiro” e vai julgar ou tentar mudar o outro “pelo bem dele”. Outro ditado, para arrematar: “de boas intenções o inferno está cheio.”

Não tenho dúvida de que o mundo precisa de empatia. De que, se ajudássemos mais os outros, tudo seria melhor. Mas nós também precisamos de um mundo que entende de verdade como empatia funciona.

E tudo bem, a gente vai errar no meio do caminho, mas com menos sentimentos feridos por bobagem e mais conversa e boa vontade, vai fazer sentido. Lembrando, claro, que nem todo mundo gosta de conversar toda hora.

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Rodrigo Ortiz Vinholo
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Written by Rodrigo Ortiz Vinholo

Publicitário, jornalista, escritor, professor e pessoa estranha.

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